APQhome – MAAT
Breviário do Quotidiano #8
Ana Pérez-Quiroga

Este ambiente doméstico em 14 tons de azul constitui a instalação APQhome – MAAT, composto pela casa, seus objetos e um jardim, dentro do espaço expositivo do museu. Nesta instalação existe a necessidade total e determinante do diálogo com os outros. Há um trabalho meu, que poderia chamar «trabalho invisível»: este processo envolve um discurso artístico, que se concretiza através da sociabilidade, uma energia pessoal que é mobilizada para a relação com os outros e que é retroalimentada por esta.
A legitimação de APQhome – MAAT, enquanto projeto artístico, é feita por mim em parceria com o museu, pelos vivenciadores e pelos visitantes. Desta forma, o sentido e o valor que dou ao espaço e aos objetos são reforçados por se tratar de um espaço e de objetos desenhados por mim, de raiz. Assim, decreto esta instalação, onde a arte e a vida coexistem e se performatizam, como condição para vivenciar a obra de arte total.
Negociação: para mim, tem o mesmo significado que comunicação, num ato plenamente democrático e performático. No âmbito desta instalação, utilizo ainda a negociação no sentido de um acordo entre as partes, mas com regras aqui e agora definidas por mim, de acordo com protocolos que estipulei mantendo uma flexibilidade que permite que estes sejam negociados com o participante (constituído como «vivenciador») e com as entidades que apoiam este projeto.
Instalação: entendo-a como uma manifestação artística que engloba a vida e que, como tal, abrange todo e qualquer espaço tridimensional, incluindo a dimensão tempo. Desta forma, a instalação abarca todos os aspetos do quotidiano, entre eles a vida doméstica, sendo ativada por mim e pela performatividade dos visitantes e dos vivenciadores.
Performance: é para mim uma arma contra os convencionalismos, numa ideia de forçar os limites artísticos. Além das relações que estabeleço com o tempo, o espaço, o vivenciador e o visitante, que são condição para vivenciar a obra total, integro ainda outras formas artísticas, como o design do mobiliário e dos objetos, a fotografia, o desenho, a serigrafia, a gravura, o filme, o vídeo, o som e o néon, que se tornam, no âmbito da instalação, objetos performáticos.
Breviário: utilizo este termo no sentido de compilação, como um diário de acontecimentos e ocorrências do quotidiano, um organizador do real. Numa cartografia dos acontecimentos que são construídos a partir de factos, memórias, escolhas, decisões e afetos. Esta compilação é fixada num suporte material, com uma dimensão digital. Todos os Breviários do Quotidiano, desde o #1 até este, o #8, são projetos performáticos em curso e em constante atualização.
Quotidiano: entendo-o enquanto vivência pessoal, na relação que estabeleço comigo mesma e com as outras pessoas, objetos, situações, viagens, e movimento no espaço/tempo. Quotidiano enquanto uma organicidade que parte de dois aspetos fundamentais, um relacionado com o lado prático e outro que lhe atribui uma vertente estética, performatizando os atos.
Casa: penso-a como espaço da minha afirmação artística. É igualmente um espaço de afirmação pessoal e política, nomeadamente no que respeita à minha consciência feminista. Incorpora o espaço físico e afetivo onde se juntam memórias, conforto, recolhimento, privacidade, sociabilidade, medos, angústias, solidão, alegrias, sexo, amor e domesticidade.
Objetos: desenhei-os e personalizei-os para que me representem, pela sua singularidade e pela sua estética. Estes objetos dependem de condições subjetivas como a minha educação, cultura e capacidade económica, porque não existe o «grau zero» da compra. Os objetos existentes em APQhome – MAAT constituem uma coleção que se encontra catalogada por categorias, e têm como denominador comum o fazerem parte desta instalação. Esta coleção de objetos e a sua catalogação encontra-se disponível em português e inglês no website apqhome.anaperezquirogahome.com, que é parte integrante deste projeto, retratando-me enquanto elemento de uma sociedade contemporânea intimamente ligada à realidade digital. No website podem ser vistos todos os objetos organizados em 14 categorias e listadas por esta ordem: Arte, Livros, Bric-à-Brac, Confecionar/Servir, Têxteis, Mobiliário, Iluminação, Eletrodomésticos, Estacionário, Higiene, Limpeza, Jardim, Pedras e Transporte, cada objeto contém uma legenda que o identifica e que inclui o preço para a sua aquisição. Estes objetos podem ser adquiridos, numa estreita ligação com as estratégias de negociação. Esta obra de arte total, numa fusão entre arte e vida é ativada através de quatro movimentos. O primeiro movimento de ativação é o estabelecimento do protocolo de reserva da instalação, semelhante ao processo de aluguer de espaços habitacionais. Estipulei duas noites como tempo adequado para a vivência, a fruição e a compreensão da instalação por parte do vivenciador, que tem à sua disposição um manual de «Instruções de Uso», um guião com sugestões de performatização. O segundo movimento de ativação é o almoço-performance, onde a imersão do vivenciador segue necessariamente um protocolo distinto, no qual a minha presença é o elemento que desencadeia o processo de negociação que aqui se estabelece, a par de uma conversa acerca de arte. O terceiro momento da ativação é a fruição por parte dos visitantes que poderão utilizar alguns dos objetos existentes no espaço. E, finalmente, o quarto movimento de ativação acontece no dia da Rentrée Party @ APQhome.
APQhome – MAAT é o espaço da minha afirmação artística e igualmente um espaço de afirmação pessoal e política, nomeadamente no que respeita à minha consciência feminista.